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A Nova Mona Lisa – Parte 3

Da força dos opostos, o equilíbrio

Através da análise sobre pontos de correspondências faciais, se vê que a Maria no desenho de Leonardo, nas tantas versões de Melzi e Luini, sobretudo, acaba por se revelar como Lisa Gherardini, também tema do retrato de “Jovem Dama”. Aliás, a julgar pela idade do infante Jesus no cartone, a Virgem Maria teria algo em torno dos dezessete anos. No caso, a modelo histórica da pintura de Da Vinci contaria com vinte e quatro - uma diferença, aqui, desprezível, ainda mais se levarmos em conta os relativismos de licença poética que sempre se entrelaçam nas representações artísticas. 
 
Sorriso eterno

O que se quer trazer para este estudo é um conjunto de evidências a corroborar a teoria da harmonia dos opostos na arte de Leonardo – desta vez, sobre sua personagem mais célebre e, mais especificamente, em versão jovem. Mas, por que estas obras não seriam, apenas, reproduções da envelhecida e cansada Mona Lisa do Louvre, já que o mundo assim vem interpretando por séculos? Simples. Primeiro, em razão da relativamente tímida exposição dos outros retratos do mestre, a fim de que se os fizessem lembrar. Segundo, pois tanto estes outros rostos em si, quanto as personagens às quais se referem remetem a mulheres jovens, jamais maduras. Aliás, na grande maioria dos trabalhos “leonardeschi” percebe-se que a fonte de inspiração é uma Gioconda rejuvenescida. Um erro secular de interpretação que, longe de ser caso raro, escolheu o maior ícone cultural da História humana como vítima, influenciando gerações de estudiosos e escritores. 

Ao célebre sorriso da “Mona Lisa” de Paris o mundo decidiu imprimir as marcas do eterno e do sagrado - é só nos lembrarmos das infindáveis e seculares “romarias” ao Louvre. Sua figura passou mesmo a sinônimo da grandiosidade do que a raça humana é capaz de criar, como discursou J.F. Kennedy quando da visita do quadro aos Estados Unidos em 1963. À primeira vista, seria algo a suplantar todas as demais realizações do Homem, encantando o expectador e pondo-se elegante e sólida diante da eternidade: ela é sensibilidade e rochedo.

Com certeza, em “Jovem Dama”, o resultado não foi outro: a pose soberana e o sorriso tão peculiar também são evidentes nessa graciosa variação, compondo com a “Mona Lisa” o retrato ideal do gênero humano em pleno alvorecer da Modernidade. O semblante daquela mulher, criada à imagem e semelhança do Criador, toma posse de toda a majestade que lhe é peculiar, e desafia quem quer que a observe. A Arte, então, seria a grande aliada de sua magnitude, pois nossa espécie também é obra da Arte de Deus - Sua obra-prima. É sobre tal ponto que o Homem assumiria estes traços - tão humanos - de inquietude e especulação (o teólogo Paul Tillich inaugura o termo “inquietação última”), aliados à sua vocação transformadora.

O Prof.Átila Soares da Costa Filho é designer, especialista em História, Antropologia e Filosofia e autor de A JOVEM MONA LISA, LEONARDO E O SUDÁRIO e co-autor de LEONARDO DA VINCI’s MONA LISA: New Perspectives. 

BIBLIOGRAFIA

Umberto Eco: “Arte e beleza na estética medieval” - Globo, 1989
Umberto Eco: “Storia della brutezza” - Bompiani, 2007
Mario Pomilio, Angela Ottino della Chiesa: “L’opera completa di Leonardo pittore” - Classici dell’arte, vol.12 - Rizzoli, 1978
Giorgio De Santillana: “Leonardo da Vinci: an Artabras Book” - Reynal & Co. e William Morrow & Co., 1965
Giorgio Vasari: “Vidas de pintores, escultores y arquitectos ilustres” - El Ateneo, 1945