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A Via Crucis por Fontana

O Instituto Italiano de Cultura de São Paulo apresenta a exposição Via Crucis, composta por 14 obras em cerâmica, produzidas pelo ítalo-argentino Lucio Fontana, logo após sua chegada na Itália, em 1947, pouco antes da elaboração do primeiro manifesto Espacialista. A Via Crúcis é considerada a obra-prima do artista que, no ápice de seu gênio inventivo, plasma um ciclo extraordinário que anuncia os memoráveis estudos para o Duomo de Milão. Trata-se de um amplo ciclo cujo tema dominante é uma linguagem de dramaticidade barroca e de grande efeito colorístico.

Lucio Fontana nasceu na Argentina, em Rosário de Santa Fé, em 1899, de pais italianos. Participou como voluntário da primeira guerra mundial e em 1918 obteve o diploma de perito edil em Milão. Em 1922 voltou com o pai, arquiteto e escultor, à Argentina, onde, dois anos depois, abriu um estúdio de escultura. Em 1928, retornou à Itália, e lá freqüentou a Accademia di Brera e os cursos de Wildt. Em 1931 realizou as primeiras “tavolette graffite” em cimento colorido, alternando até o final dos anos  40, a produção abstrata e a figurativa.

Em 1934 uniu-se ao grupo dos abstratos da milanesa Galleria del Milione. No ano seguinte experimentou a cerâmica com Tullio d’Albisola e em 1937 na manufatura de Sèvres. Quando explodiu a segunda guerra mundial escolheu morar na Argentina. De volta à Itália publicou entre 1947 e 1952 cinco manifestos nos quais elaborou o Spazialismo. Em 1949 apresentou na Galleria del Naviglio de Milão l’Ambiente spaziale a luce nera, iluminando um espaço escuro com luzes de Wood afim de transmitir uma sensação espacial de infinito. Dois anos depois usou a luz como signo lingüístico na instalação do teto da IX Trienal de Milão.

Em 1952, na Galleria del Naviglio, expôs pela primeira vez telas cobertas de buracos para anular o espaço bidimensional do suporte. As obras dos anos seguintes enriquecem-se graças ao uso de areias espalhadas e fragmentos de vidro colorido. Em 1959 a Galleria del Naviglio expôs os primeiros “taglia”, elementos característicos, junto com os “buchi”, de sua produção. Nos anos seguintes sua experimentação desenvolveu-se de forma consistente. Morreu em Comabbio, Varese, em 1968.

Informações

Data: até domingo, 2 de setembro de 2007
Horários: Seg/Sex: 12 às 21 / Sab/Dom/Fer: 10 às 18
Local: Centro Universitário Maria Antônia, Rua Maria Antonia, 294 – 2º andar
Organizado por: Instituto Italiano de Cultura de São Paulo
Em colaboração com: Centro Universitário Maria Antônia

Lucio Fontana - trinta anos depois

Lucio Fontana foi o apogeu italiano, para não dizer europeu, do modernismo pós-guerra. Modernidade além da guerra. A intelligentsia européia entre-guerras, impelida pelo avanço nazista, atravessou o Atlântico e partiu para engrossar o sonho americano•e até mesmo quando retornou, o fez em um clima de "Fiesta" à la Hemingway. Enquanto isso, o modelo americano, personificando-se na estética greenberguiana, preparava-se na crista da vitória para tornar-se um modelo universal, sustentado pela fé heróica da Nova Fronteira, da ética puritana e da iconoclastia judaica, um modelo em que o espiritualismo e o materialismo estavam unidos na idéia de Forma•a Antiforma é apenas o outro lado da medalha, ou, se assim quiserem, da moeda. A partir da periferia•Argentina•Fontana lança o seu "Manifiesto blanco" [Manifesto branco] que anseia por uma modernidade sem domínio, uma medida concreta contra qualquer ilusionismo. Fontana tinha se aproximado do modernismo desde o início da década de 30, por causa de sua proximidade com os abstracionistas da Lombardia, sua associação e colaboração com arquitetos•desde Edoardo Persico até Giuseppe Terragni•com o seu expressionismo dionisíaco de matriz barroca. Ele sempre esteve mais interessado na expansão do espaço do que na exploração dos meandros da alma.

A felicidade de Fontana antes da guerra não foi jamais alcançada no pós-guerra, mas ao mesmo tempo percebe-se que ele foi de algum modo limpo de sua melancolia e tudo tornou-se dinamicamente positivo. A guerra marca aí um limite negativo, que breca qualquer prazer suspenso, mas Fontana mais uma vez contrapõe a isto uma tensão positiva. Ele retorna ao Eu essencial, e o gesto individual torna-se o ato supremo do artista, mesmo quando manuseia os novos materiais que a tecnologia oferece a uma cultura expansionista. Continua e define, em formas não servilmente decorativas, sua colaboração com os arquitetos. Sua escola teria mais influência sobre os designers italianos da época do que sobre a arte contemporânea, cujas agitações democráticas acabam sempre tendo fôlego curto.

Desde o "Manifiesto blanco" de Buenos Aires, de 1945 (não assinado por Fontana, mas redigido sob sua influência direta por Bernardo Arias, Horacio Cazeneuve e Marcos Fridman) até os manifestos do Espacialismo italiano, Spaziali. "Primo manifesto spaziale" [Espaciais. Primeiro manifesto espacial], Milão, 1947; "Secondo manifesto spaziale" [Segundo manifesto espacial], Milão, 1948; "Proposta di un regolamento. Manifesto spaziale" [Proposta de um regulamento. Manifesto espacial], Milão, 1950; "Manifesto dellËarte spaziale. Quarto manifesto spaziale" [Manifesto da arte espacial. Quarto manifesto espacial], Milão, 1951; "Manifesto tecnico" [Manifesto técnico], Milão 1951; "Manifesto del movimento spaziale per la televisione" [Manifesto do movimento espacial, para a televisão], Milão 1952•,o percurso é bem curto. Contudo são daquele tempo os primeiros Concetti spaziali [Conceitos espaciais] (de 1947), e foi nesse contexto que ele fez as primeiras experiências de "buracos" perpetrados sobre o papel colado sobre a tela, ou sobre a tela preparada, e se têm as primeiras monocromias (no máximo em 1949) às quais ele retornaria em ciclos e séries: Attese [Esperas], de 1959; Squarci [Rasgos] de 1962; as formas ovóides de La fine di Dio [O fim de Deus] entre 1962 e 1964.

As monocromias de Fontana são antes de mais nada superfície, como campo sobre o qual incide o evento do buraco, do corte, do rasgo. O evento é o resultado de um gesto, gesto individual, que é tanto anônimo quanto específico, mas não personalizado.

A superfície é aquela da pintura, em sua mais alta e nobre tradição, dos ícones bizantinos, de Giotto, Piero della Francesca a Rafael, Manet e Mondrian. Porém os tons são sempre mais ácidos, até mesmo quando se trata da tela branca: amarelos, verdes, azuis minerais e metálicos, vermelhos oxidados, rosas que tendem a ser violeta, cores nunca puras, que se desviaram de sua sublime pureza para encontrar em valências tímbricas de uma modernidade substantivada por princípios de produtividade. E estes princípios, como ácidos, corroeram as escalas cromáticas dos antigos mestres, que ao contrário, tendiam a um purismo sublime.

O campo oferecido pela superfície da pintura, e que Fontana define na medida exata, é um campo de forças por causa do conteúdo simbólico que a tradição e a história, da arte ocidental, contribuíram para construir: plano da representação, superfície da projeção do imaginário, espelho opaco das coisas, espaço ilusório ou concreto para a construção das figuras e dos ícones. Fontana o delimita e desnuda em suas monocromias, quer seja o branco da tela preparada, quer seja uma cor. Nela, cada figura é reabsorvida e desaparece cede o campo e o olhar se deixa ficar neste lugar esvaziado de qualquer determinação adicional. Então, nós seremos devolvidos a nós mesmos, à nossa liberdade e à nossa solidão recíproca; prontos. Prontos para o evento que sempre esperamos. E o evento se dá como corte, perfuração, ferida, ferida aberta, violação da superfície homogênea. Não mais via de fuga ao imaginário, não texto e protesto fantástico na representação ilusória que nos é dada como alimento, como o osso ao cão, mas sim abertura.

A ação do artista, um ato de vontade, afirma a posição, o status, o agente. Ao mesmo tempo, ao abrir a superfície, corta o plano simbólico e inaugura a vinda do "Altro-da-sé" [Outro-por-si]. Interrompe a relação legítima sobre a qual historicamente se fundamentou a dimensão da arte e, de maneira análoga, o relacionamento que se constituiu entre o sujeito agente e o mundo através de articulações lingüísticas codificadas. Corrói a estrutura fechada do sistema da pintura, do sistema da arte, do sistema da cultura, e a abre às regiões ulteriores do não dito, do indizível e do não representável. Tira a casca do hoje para revelar dimensões do futuro: traspassando o espaço dado ou concedido, traspassa o tempo de sua própria permanência nele. (Fontana como Italo Calvino, como um Borges traduzido e editado por Calvino.) Do lado de cá está a linguagem, o espaço ocupado pelo Eu subjetivo, do outro lado, além, está o desconhecido: o corte é a marca da paixão, uma paixão que o rigor da razão esfriou, mas não extinguiu, e do desejo sem nome e sem limites. Fontana, animado pelas pulsões que conjugam a modernidade em termos libertários e anarquistas, somando a liberdade da tradição iluminista da Lombardia com a anarquia do aventureiro argentino, reencontra um novo tempo.(Pier Luigi Tazzi/Traduzido do italiano por Eugènia Deheinzelin - Curadoria da Fundação Bienal de São Paulo)

Lucio Fontana: Manifiesto Blanco i Spazialismo

Lucio Fontana nasce in Argentina, a Rosario di Santa Fè, il 19 febbraio 1899. Il padre Luigi, italiano, in Argentina da una decina d'anni, è scultore e la madre, Lucia Bottino, di origine italiana, è attrice di teatro. A sei anni, con il padre, viene a Milano per frequentare le scuole. Già nel 1910 inizia il suo apprendistato artistico nella bottega paterna. Si iscrive poi a una scuola per Maestri Edili che lascia per arruolarsi come volontario nella prima guerra mondiale. Ferito, è congedato con medaglia d'argento al valore militare; riprende quindi gli studi e si diploma.

Nel 1921 torna in Argentina, a Rosario di Santa Fè e inizia la sua attività di scultore nella bottega di scultura del padre. Apre poi un proprio studio a Rosario. Tra il 1925 e il 1927 vince alcuni concorsi e realizza, tra gli altri, il monumento a Juana Blanco.

Torna a Milano nel 1928 per iscriversi, come allievo di Adolfo Wildt, al 1° corso dell'Accademia di Brera: a fine anno è promosso al 4° corso. Partecipa intanto a esposizioni e concorsi in Italia, in Spagna e in Argentina. Nel 1930 conosce Teresita Rasini che diventerà sua moglie. Spaziando tra figurativo e astratto, la sua scultura, sia in terracotta sia in gesso, con o senza colore, diventa più libera e personale. In quegli anni, importantissimi per la sua ricerca artistica, sempre più riconosciuta dai maggiori critici, da Argan a Belli, Persico, Morosini, partecipa alla Triennale di Milano, alla Biennale di Venezia, alla Quadriennale di Roma; espone più volte alla Galleria del Milione, inizia l'attività di ceramista ad Albisola e, nel 1937, alla Manifattura di Sèvres dove realizza alcune sculture di piccolo formato che espone, e vende, a Parigi. Intensa, già in questo periodo, la sua attività con gli architetti più all'avanguardia.

All'inizio del 1940 parte per Buenos Aires, dove si stabilisce, lavora intensamente e vince vari concorsi di scultura. Professore di modellato alla Scuola di Belle Arti, nel 1946 organizza con altri una scuola d'arte privata: l'Accademia di Altamira che diventa un importante centro di promozione culturale. E' proprio qui che, in contatto con giovani artisti e intellettuali, elabora le teorie di ricerca artistica che portano alla pubblicazione del Manifiesto Blanco.

Rientrato a Milano nell'aprile del 1947, Fontana fonda il "Movimento spaziale" e, con altri artisti e intellettuali, pubblica il Primo Manifesto dello Spazialismo. Riprende l'attività di ceramista ad Albisola e la collaborazione con gli architetti. L'anno seguente vede l'uscita del Secondo Manifesto dello Spazialismo. Nel 1949 espone alla Galleria del Naviglio l'Ambiente spaziale a luce nera suscitando al tempo stesso grande entusiasmo e scalpore.

Nello stesso anno nasce la sua invenzione più originale quando, forse spinto dalla sua origine di scultore, alla ricerca di una terza dimensione realizza i primi quadri forando le tele.

Continua a essere invitato alle Biennali di Venezia, alle Triennali di Milano. Nel 1950 esce il terzo manifesto spaziale Proposta per un regolamento. Nel 1951, alla IX Triennale, dove per primo usa il neon come forma d'arte, legge il suo Manifesto tecnico dello Spazialismo. Partecipa poi al concorso indetto per la Quinta Porta del Duomo di Milano vincendolo ex-aequo con Minguzzi nel 1952. Nello stesso anno firma con altri artisti il Manifesto del Movimento Spaziale per la Televisione ed espone per la prima volta in modo compiuto le sue opere spaziali alla Galleria del Naviglio di Milano. Scatenando di nuovo entusiasmo e sgomento, oltre a forarle, Fontana dipinge ora le tele, vi applica colore, inchiostri, pastelli, collages, lustrini, frammenti di vetro. E' ormai noto e apprezzato anche all'estero. Nel 1957, in una serie di opere in carta telata, oltre ai buchi e ai graffiti appaiono, appena accennati, i tagli ai quali arriverà compiutamente l'anno successivo: dalle tele a più tagli colorate a velature a quelle monocrome intitolate Concetto spaziale, Attesa. Mostre e partecipazioni a manifestazioni internazionali si susseguono a ritmo sempre più intenso: i musei, le gallerie e i collezionisti più sensibili acquistano le sue opere. Uomo di grande generosità, sempre pronto, anche quando materialmente non ne aveva ancora la possibilità, ad aiutare i giovani artisti, Fontana li incoraggia, ne acquista le opere, fa loro dono delle sue anche se, nella maggior parte dei casi, sa che saranno subito vendute.

In quegli anni Fontana realizza, oltre a sculture in ferro su gambo, una serie di opere in terracotta, note come Nature: sorta di sfere su cui interviene con larghi squarci o ferite a taglio; continua anche a eseguire lavori in ceramica di grande e di piccolo formato e a collaborare con i maggiori architetti per opere di environnement, denominate Ambiente spaziale, in cui impiega la luce come elemento innovativo, secondo una tecnica ripresa poi da altri artisti.

Negli anni '60, di ritorno da New York, Fontana, ispirato dalle luci della città, realizza una serie di opere su lastre di metallo. Si dedica poi a una serie di dipinti ovali, a olio, tutti dello stesso formato, monocromi e costellati di buchi, di squarci, a volte cosparsi di lustrini, che chiama Fine di Dio. Lo stesso tema si ritrova, nel 1967, in una serie di ellissi in legno laccato a colori squillanti, pezzi unici realizzati su suo disegno. Tra il 1964 e il 1966 inventa i Teatrini: cornici in legno sagomato e laccato che racchiudono tele monocrome forate. Non abbandona però i "tagli", cui rimane fedele sino all'ultimo, e nel 1966, per la sua sala bianca, con tele bianche segnate da un solo taglio verticale, la giuria internazionale della XXXIII Biennale di Venezia gli assegna il primo premio per la pittura.

Lasciata Milano e trasferitosi a Comabbio, paese d'origine della sua famiglia di cui aveva restaurato la vecchia casa colonica, muore il 7 settembre 1968.

La presenza di opere di Fontana nelle collezioni permanenti di più di cento musei di tutto il mondo sono un'ulteriore conferma dell'importanza della sua arte.(Fondazone Lucio Fontana)