Cidadania de ítalo-brasileiros volta a ocupar a imprensa italiana
Município vêneto cobra por prática da cidadania italiana. Iniciativa pode servir de modelo a outros municípios da região.
A medida visa reduzir o alto fluxo de trabalho gerado com pedidos de buscas e transcrições de documentos. O valor cobrado pode chegar a 2.000 euros.
A iniciativa do prefeito Matteo Pressi, de Soave, município de 70 mil habitantes na Província de Verona (Vêneto), em instituir uma tabela de preços para os serviços que envolvem a prática da cidadania italiana, foi tema de matéria no jornal L’Arena, no último sábado (13/07). A razão alegada para a cobrança, que teve início no ano passado, é a necessidade de o município contrapor-se à alta demanda de trabalho gerada pelos “novos cidadãos italianos”. A iniciativa poderia servir de inspiração a outros municípios da região que vivem a mesma realidade. Em contraposição, o advogado Enrico Varali defende que os funcionários públicos sejam mais bem remunerados e a lei da cidadania seja cumprida.
Acompanhe, a seguir, matéria do jornal veronese L'Arena, assinada pela jornalista Paola Bosaro.
Brasileiros e dupla cidadania, Soave apresenta tabela de preços para a prática
È pioggia di richieste di cittadinanza italiana dal Brasile.
Prefeito Pressi: “Negócios para os advogados, mas um fardo para os cartórios”. Advogado Varali: “É um direito ou a lei deve ser alterada”.
O ovo de Colombo é chamado de “Direitos de Pesquisa”. O prefeito de Soave, Matteo Pressi, descobriu-o no verão passado. No caos que está sendo criado pelo auge dos pedidos de reconhecimento da cidadania italiana por parte dos brasileiros, o prefeito da cidade murada decidiu trazer alguma ordem, criando a partir do zero uma barreira econômica. “Quer que eu reconheça a sua cidadania italiana jure sanguinis? Pague pelo trabalho de busca dos documentos que os funcionários municipais terão que realizar.”
Tarifa
Por resolução do Conselho, foi fixada uma tabela de preços que vai dos 2.000 euros (se o cartório tiver de realizar todo o procedimento, partindo apenas do nome do ascendente) até 500 euros (se o pedido for acompanhado das informações essenciais e deverá apenas ser completada com pesquisa genealógica e dos certificados presentes em arquivo). Graças a este expediente, já contestado por um advogado há alguns meses perante o TAR, mas que resultou em regular, o município de Soave reduziu drasticamente o número de pedidos de cidadania a processar.
“As inscrições passaram de 180 para 30 em um ano”, relata. “Afinal, nada mais fizemos do que acrescentar um reembolso à produção de documentos pelas secretarias municipais, que se soma aos honorários de secretariado, já previstos na lei", esclarece Pressi, que poderá também servir de pioneiro para outras administrações municipais em dificuldades, como Bonavigo e Roverchiara.
Para o prefeito de Soave, o boom dos procedimentos de cidadania constitui "um negócio para os escritórios de advogados italianos, mas um fardo injustificado para os cartórios municipais que, de fato, são obrigados a realizar laboriosas pesquisas e transcrições durante semanas inteiras, a favor de cidadãos que, pelo menos até que ocorra o reconhecimento, são estrangeiros.”
A opinião do advogado
Enrico Varali, advogado especialista em direito de imigração e cidadania, tem uma opinião completamente diferente, que convida a olhar para a questão dos brasileiros que aspiram se tornar italianos de um ponto de vista diferente daquele que surgiu até agora: “Os pedidos de cidadania italiana por descendentes de emigrantes italianos estão aumentando continuamente? Não vamos recuar nos direitos; em vez disso, fornecemos mais recursos e mais pessoal aos entes envolvidos. O critério ius sanguinis é o primeiro e um dos mais antigos para o reconhecimento da cidadania, segundo o nosso código civil. A lei de 1992 refere-se à de 1912 que, por sua vez, reiterou o princípio estabelecido em 1865”.
O critério estabelece que é cidadão italiano por nascimento o filho de pai ou mãe cidadão italiano. Com base nisso, o local onde ocorre o nascimento (na Itália ou no exterior) é irrelevante, desde que seja respeitada a linhagem, ou seja, descendência de pessoa com cidadania italiana. O advogado Varali está ciente da difícil situação vivida nos cargos públicos e no tribunal ordinário de Veneza, sobrecarregados por uma enxurrada de pedidos que chegam todos os meses. "Esta situação é, em parte, consequência do fato de os Consulados de São Paulo e de Curitiba terem parado de responder aos pedidos dos brasileiros num prazo razoável", revela. "Conseguir marcar uma consulta é muito difícil e, quando se consegue, submete-se o pedido e espera-se a resposta que chega cinco anos depois".
O advogado conheceu alguns descendentes de vênetos que emigraram para o Brasil nos anos entre os séculos XIX e XX, especialmente nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Espírito Santo. "O vínculo cultural com a Itália, e com o Vêneto em particular, nunca foi interrompido", continua, "tanto que meio milhão de pessoas no Brasil falam Taliàn, uma língua que mistura dialetos vênetos do início do século XX e é estudado mesmo na Universidade. Ouvi falar do caso de uma avó que antes de morrer quis dar aos seus dois netos um passaporte italiano, justamente para reafirmar a sua identidade italiana.”
O advogado veronese espera que o Estado dê mais recursos aos Municípios e aos tribunais para concluir os procedimentos, “caso contrário, mude-se a lei".
L'Arena - Paola Bosaro - 13/07/2024
Leia aqui a matéria em italiano
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