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Quem ainda pode solicitar a cidadania italiana por descendência?

Por Giuseppe Pinelli

Na sexta-feira, 28 de março de 2025, o governo italiano aprovou um decreto-lei urgente que modificou de forma significativa as regras para o reconhecimento da cidadania italiana por descendência (iure sanguinis). Essa medida gerou muita preocupação entre os ítalo-descendentes em todo o mundo, especialmente no Brasil, onde milhões de pessoas têm origem italiana.

Mas afinal: quem ainda tem direito à cidadania italiana depois desse decreto? E o que muda na prática?

O que diz o decreto

O decreto introduz um novo artigo (3-bis) na Lei de Cidadania Italiana (Lei nº 91/1992), estabelecendo que, a partir de agora, será considerado como nunca tendo adquirido a cidadania italiana quem:

- Nasceu no exterior (fora da Itália), mesmo antes da data de entrada em vigor do decreto;

- Possui outra cidadania no momento do pedido.

Exceto nos seguintes casos:

1. Quem entrou com o pedido administrativo no consulado ou na prefeitura até às 23h59 (hora de Roma) do dia 27 de março de 2025;

2. Quem entrou com ação judicial na Itália até essa mesma data;

3. Quem tem pai ou mãe italiano(a) nascido(a) na Itália;

4. Quem tem pai ou mãe italiano(a) que morou na Itália por pelo menos dois anos consecutivos antes do nascimento;

5. Quem tem avô ou avó italiano(a) (por parte de pai ou mãe) nascido(a) na Itália.

Quem ainda pode solicitar?

Se você já nasceu e ainda não fez o pedido de reconhecimento da cidadania, você ainda pode ter direito, desde que se enquadre em uma das exceções acima.

Resumindo, ainda podem solicitar a cidadania italiana:

- Pessoas com ascendentes diretos nascidos na Itália (pai, mãe, avô ou avó);

- Pessoas cujo pai ou mãe italiano(a) residiu na Itália por 2 anos antes do nascimento;

- Pessoas que já entraram com o pedido no consulado ou na justiça italiana antes de 27 de março.

O que acontece com os demais descendentes?

Para aqueles que não se enquadram nas exceções e não fizeram o pedido até 27 de março, o novo decreto estabelece que essas pessoas nunca adquiriram a cidadania italiana, mesmo que todos os documentos comprovem a linha de sangue italiana.

Essa mudança representa uma ruptura inédita na tradição jurídica italiana, que sempre reconheceu a cidadania iure sanguinis como um direito originário, ou seja, adquirido automaticamente no nascimento, bastando provar a descendência sem interrupções.

Existe chance de reversão?

Sim. O decreto-lei ainda precisa ser convertido em lei pelo Parlamento italiano dentro de 60 dias. Nesse processo, os deputados e senadores podem:

- Modificar o texto;

- Eliminar as partes mais polêmicas (como a retroatividade);

- Introduzir prazos de carência ou transição.

Além disso, associações e juristas já anunciaram que irão apresentar ações judiciais na Itália e na Corte Europeia de Direitos Humanos, alegando violação do direito adquirido e do princípio da igualdade.

O que fazer agora?

Se você se encaixa em alguma das exceções, é urgente reunir a documentação e protocolar seu pedido o quanto antes.

Se você não se encaixa, não perca a esperança: acompanhe as atualizações legislativas, mantenha sua documentação pronta e considere apoiar as iniciativas jurídicas em defesa dos direitos dos ítalo-descendentes.

Em conclusão, o decreto de 28 de março representa uma mudança drástica e controversa na cidadania italiana por sangue. No entanto, o processo legislativo ainda está em andamento e o debate está longe de terminar. Em momentos como este, informação, organização e ação coletiva são as melhores ferramentas para proteger direitos e construir soluções justas para todos.

Giuseppe Pinelli é graduado pela Università degli Studi di Palermo (Sicilia) e atua como advogado desde 2004; é sócio do escritório Pinelli Schifani & Caronia, habilitado a atuar em Tribunais Superiores na Itália e como Solicitor na Inglaterra e País de Gales, desde 2016. Professor adjunto da Universidade LUISS Guido Carli (Roma), ministra cursos sobre “Sistema Jurídico na Era Digital” e “Governança Corporativa Comparada”; possui mestrado em Direito (LLM), focado em Direito Internacional e Estudos Legais, obtido junto à London School of Economics and Political Science (LSE); também frequentou a Hamline University (Minnesota – EUA) e a Universidade de Roma “La Sapienza”. É palestrante em seminários sobre Direito Digital em diversas Universidades brasileiras.

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