Silvio Soldini realiza filme baseado em romance de Kristof
PEDRO BUTCHER
Crítico da Folha de S.Paulo
Depois de "Pão e Tulipas", comédia familiar que fez sucesso no circuito "de arte" brasileiro, o italiano Silvio Soldini mudou radicalmente de estilo em "Queimando ao Vento". O diretor parece até ter decalcado este novo filme como um negativo de seu trabalho anterior. Não há sinal nem sequer da Itália, que surge apenas nos segundos finais.
A leveza diluída de "Pão e Tulipas" foi substituída por uma pretensa densidade literária. "Queimando ao Vento" tem como base o romance "Ontem", de Agota Kristof, escritora húngara radicada na Suíça. A narrativa literária é marcante: o roteiro recorre, inclusive, a uma narração em off com flancos poéticos reproduzindo um "fluxo de consciência" que descreve sonhos e desvela pensamentos do personagem central.
Esse personagem é Tobias Horvath, um tipo dostoievskiano, que foge para a Suíça ainda criança, após atacar o próprio pai com uma facada. Quando o filme começa, ele já é um imigrante angustiado, trabalhando numa fábrica de relógios, assombrado pelo fantasma de sua infância, ao lado da mãe pobre e prostituta, que será narrada em flashback.
Se, em "Pão e Tulipas", Soldini trabalhou com uma síntese um tanto simplista da Itália, aqui ele recorre a idéias estabelecidas tanto da Suíça (o tédio, a fábrica de relógios, a frieza) como do Leste Europeu (uma tendência quase inata à violência). São estereótipos que deixam o filme muito longe de atingir a densidade literária desejada. Mais incômodo ainda, talvez, é o fato de que não há imagem no filme que não remeta à obra de um outro cineasta (Krzysztof Kieslowski). Nenhuma delas é capaz de potencializar essa referência de forma original, o que deixa esse "Queimando ao Vento" com um aspecto redondamente sub-kieslowskiano.
Queimando ao Vento
Direção: Silvio Soldini
Produção: Itália/Suíça, 2001
Com: Ivan Franek, Caroline Baehr
Quando: em cartaz no Cinesesc, Espaço Unibanco, Frei Caneca Unibanco Arteplex e Sala UOL de Cinema
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