Livro relata em versos as aventuras de poeta italiano em terras brasileiras
Por Mara Rocha
Pode o amor pela pátria brasileira dar sentido à existência humana e ganhar a forma de poesia? Sim. É o que mostra o poeta ítalo-brasileiro Salvatore Barbato, com o livro “Sobre as asas do mar”. Publicado em 2008 pela Câmara Brasileira de Jovens Escritores, o livro é como um diário, onde o poeta conta em versos as experiências vividas em seus onze anos passados no Brasil, a sua “terra infinita”.
Filho de pai italiano e de mãe carioca, Barbato nasceu em Avelino, sul da Itália, em 26 de março de 1975. Apesar da descendência brasileira, não obteve a dupla cidadania: os pais de Barbato se recusaram a registrá-lo no Consulado Brasileiro. “O meu pai era muito nacionalista e não aceitava a idéia de que os seus filhos pertencessem também a outra pátria”, conta. A intransigência do pai não impediu a aproximação entre o poeta e o Brasil, país onde, na infância, passava as férias.
Aos quatro anos de idade, Barbato se transferiu com a família para Milão e ali ficou até a adolescência. O clima da cidade grande e industrial não agradaram o poeta. “As pessoas eram frias e o céu cinza. Difícil de suportar”, explica. Com a maioridade e contra a vontade dos pais, Barbato mudou para o Brasil, cenário perfeito para iniciar a sua atividade de poeta.
Entrou como turista italiano no Rio de Janeiro e por lá ficou como clandestino por cerca de três anos. Sem a documentação da mãe, não tinha como provar a descendência brasileira. Obstinado, iniciou, aos dezoito anos, uma nova aventura na pátria amada. Viveu amores intensos, fez amigos e inimigos, sofreu desilusões. No Brasil, Barbato aprendeu a chorar. Provou sensações e sentimentos nunca experimentados na Itália. “Quando cheguei no Rio, enquanto esperava o ônibus, conversei com vários desconhecidos. Algo impossível de se fazer na Europa. Foi maravilhoso”, lembra.
Dividido entre a capital carioca e São Paulo, trabalhou como professor de italiano e técnico de informática, ganhando pouco. “Faltava dinheiro, mas nunca a felicidade, porque eu estava no Brasil, entre pessoas queridas”, diz. Barbato lembra da generosidade dos amigos brasileiros quando, às vezes, “não tinha o que comer em casa, mas um prato de feijão, arroz e carne não faltava, porque meus amigos me ajudavam”.
Com o passaporte europeu vencido e sem a autorização para continuar no Brasil, chegou a ser parado pela Polícia Federal duas vezes. A segunda aconteceu quando o poeta tentava retornar para o Brasil de uma viagem ao Paraguai e foi definitiva. Triste, viu-se obrigado a voltar para a Itália, mas não resisistiu muito tempo longe da terra amada. O Brasil já tinha se tornado a casa do poeta e no país italiano sentia-se um estrangeiro. Convenceu a mãe a entregar a documentação exigida pelas autoridades brasileiras e voltou. Finalmente, Barbato teve reconhecida a sua cidadania brasileira.
Após onze intensos anos no Brasil, o poeta, agora ítalo-brasileiro, viu-se obrigado a abandonar a nova pátria. Barbato tinha se especializado como assistente de vôo. Era 2003 e as empresas aéreas ainda sentiam o peso do atentado de “11 de setembro de 2001” nos Estados Unidos, evitando novas contratações. Conseguiu emprego em uma empresa aérea italiana, tendo que deixar o Brasil. As recordações e o amor pela sua amada pátria o acompanharam e, mesmo morando tão longe, escolheu a língua portuguesa para a publicação do seu primeiro livro.
Hoje, casado com uma italiana, tem um filho com dupla nacionalidade e espera voltar um dia com a família para morar no Brasil, “mesmo com cinqüenta anos de idade”, brinca.
As aventuras do poeta em terras brasileiras é contada em versos modernos, com uma linguagem simples e sincera. Qualidade que torna a leitura dinâmica e interessante. Cada amor, cada amigo e inimigo, cada frustração contados como em um diário de sonetos e poemas simples, mas envolventes. Em cada folha, um pedaço da vida de Barbato. Histórias de superação e perseverança. Alguns fatos tristes, outros divertidos, como o poema onde conta da tia fofoqueira e das situaçãoes embaraçantes por ela criadas. Comoventes como quando fala do nascimento do filho e românticas quando se refere à esposa Nora. Angustiantes os poemas relatos da sua luta pelo visto brasileiro. Em todos é possível perceber a vontade do poeta de seguir adiante, superando as dificuldades da vida. “Sobre as asas do mar” leva o leitor à reflexão sobre o que é a felicidade, ao mesmo tempo que ensina a valorizar a pátria brasileira.
maraorocha@yahoo.com.br
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