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Poemas de Enrico Testa

Genovês de nascimento, Enrico Testa (1956) é, sem dúvida, uma das vozes mais representativas e atentas da poesia italiana contemporânea. Uma pista da sua potencialidade talvez já estivesse na estreia como poeta, em 1988, com Le faticose attese, prefaciado por Giorgio Caproni, grande poeta da segunda metade do século 20, com quem Testa empreende um profundo diálogo, sem deixar de trilhar as suas próprias veredas. Giovanni Giudici, outro importante poeta, há 20 anos, numa resenha, também já confirmava e enfatizava a força e a originalidade da sua escritura. Como Caproni, que adotou uma parte da Ligúria, e Montale, que sempre manteve uma forte relação com sua terra natal, algumas zonas da Ligúria povoam as suas páginas com um tom e um ritmo próprios. A relação com a natureza, os animais, fatos e movimentos do cotidiano são alguns elementos que delineiam a sua poética juntamente com os do sonho e o da viagem. Encontros/desencontros, à primeira vista nada representativos, coisas de um dia a dia, são todos explorados por Enrico Testa. Se por um lado, podemos pensar na sua poesia como uma busca de si, mas também uma tentativa de compreensão do “estar” e “fazer parte” do mundo, por outro, configura-se também uma operação de busca por um contato, por um outro (o próprio leitor?), enfim, uma via comunicação.

Os poemas

O primeiro poema publicado aqui é totalmente inédito, inclusive na Itália. E trata de uma situação comum, como tantas outras, vivida com tédio, mas que pode, sempre dependendo da paciência e do olhar, ser deslocada e reinventada. É, exatamente, essa operação que Enrico Testa propõe ao estar no aeroporto da cidade de Cagliari, na Sardenha, esperando por um voo. Aqui não cabe uma análise do poema, mas o leitor irá perceber que a sensação de tédio, muito característica desses contextos, não é a única. Ela vai aos poucos diminuindo, quando o olhar passa a encontrar alguns subterfúgios e caminhos, as estrofes seguem esse movimento, vão diminuindo, a descrição mais física abre espaço para as sensações e o vazio d’horas se reinventa. Os outros dois poemas, já publicados na Itália pela prestigiosa Einaudi, são inéditos em português e pertencem respectivamente a In controtempo (1994) e Pasqua di neve (2008). Outros dois momentos da produção de Enrico Testa e duas características suas já sobressaem: uma é a ausência de título; e a segunda é o fato de ele iniciar a poema com letra minúscula e terminá-lo sem um ponto final. Quem sabe não seja esse um convite para o leitor se “apropriar” da página? No poema retirado de In controtempo, os já mencionados elementos da natureza são evidentes, a cobra aparece no primeiro verso, mas o gregal, vento típico do mar Mediterrâneo, antes estava em Vazio d’horas. Duas estrofes, como se uma fosse o espelho da outra, que apontam para diferentes reflexos. O terceiro poema, mais uma vez, pontua a natureza, uma indicação da temporalidade cíclica, certa ancestralidade (elementos do arcaico), de um lado, e a “ilegibilidade” do bando de meninos com sua juventude e frenesia, de outro.

No Brasil, Enrico Testa publicou em 2013 a coletânea Ablativo, pela Rafael Copetti Editor.

VUOTO D’ORE

il vuoto d’ore all’aeroporto di cagliari elmas,

da te patito con un certo dispitto,

l’ho poi colmato a poco a poco in vari modi:

un passaggio in libreria

con l’acquisto di un rulfo d’annata;

la lunga sosta beata nel self-service deserto:

insalata mista e trebbiano scadente

ma premessa di stordita requie.

I messaggi da casa:

un tamtam digitale

di quando torni? stai bene?

I viaggiatori incerti tra i banconi.

Le commesse ai negozi dei prodotti locali:

miele amaro e biscotti

parole e accenti diversi

e diversi modi di dire.

All’edicola per i giornali.

Persone: singolari e plurali.

Il dialogo con il volto inca

dell’addetta ai bagni,

faticoso ma amabile

e tutto in lingua mancina.

E poi fuori, seduti sulla panchina

di fronte ai pullman,

riconoscersi uguali nel grecale

che piega le palme.

Il vuoto lasciamolo al dopo

e ai suoi falsi, interessati profeti.

Al momento a me basta questo rosario di sguardi.

O anche solo il riflesso d’ambra

che, alla partenza o al ritorno,

inclina, nella stretta, l’occhio sulla mano

in cerca di conforto

VAZIO D’HORAS

o vazio d’horas no aeroporto de cagliari elmas,

pra ti tem preço de certo desprezo

depois, pouco a pouco, colmei em vários modos:

um passeio na livraria

com a compra de um rulfo de safra;

a longa parada beata no self-service deserto:

salada mista e trebbiano ordinário

mas premissa de desnorteante trégua.

As mensagens de casa:

um tamtam digital

digas quando voltas? estás bem?

Os viajantes indecisos entre os guichês.

As vendedoras nas lojas dos produtos locais:

mel amargo e biscoitos

palavras e sotaques diversos

e diversos modos de dizer.

À banca para os jornais.

Pessoas: singulares e plurais.

O diálogo com o rosto inca

da zeladora dos banheiros

fadigoso mas amável

e tudo numa língua manca.

E, ainda, lá fora, sentados no banco

na frente dos ônibus

reconhecer-se iguais no gregal

que dobra as palmeiras.

O vazio, deixamo-lo para depois

e para seus falsos, interessados profetas.

No momento, basta-me este rosário de olhares.

Ou mesmo só o reflexo âmbar

que, na partida e no retorno,

inclina, no aperto, o olho na mão

em busca de contorto

ENRICO TESTA

Nasceu em Gênova, na Itália, em 1956. É uma das vozes mais representativas da poesia italiana contemporânea. Estreou na poesia em 1988, com Le faticose attese. A relação com a natureza, os animais, fatos e movimentos do cotidiano são alguns elementos que delineiam a sua poética juntamente com os do sonho e o da viagem.